A primeira páscoa foi instituída no Egito, para marcar o princípio dos meses.
Pessach, a páscoa judaica (Foto: Direitos Reservados/Deposiphotos) |
Em breve celebraremos a Páscoa. Mais especificamente entre os dias 27 de março a 4 de abril a páscoa judaica, e no dia 4 de abril a denominada páscoa cristã. Essa é uma festa que judeus e cristãos comemoram todos os anos desde que ela foi introduzida.
Mas como foi a primeira Páscoa?
O contexto é a libertação do povo hebreu da escravidão no país das pirâmides, liderada por Moisés, o filho de uma hebreia que foi criado no palácio de faraó como filho da filha de faraó. Cônscio de sua origem, Moisés, após matar um egípcio ao defender o seu povo, foge para a terra de Midiã, e passa a viver como um pastor de ovelhas. Contudo, ele era o escolhido por Deus para livrar o seu povo da escravidão no Egito. Deus aparece à Moisés na sarça ardente e o comissiona a voltar ao Egito e libertar o seu povo (Êxodo 3). No primeiro momento, Moisés resiste, mas acaba cedendo e retorna ao Egito com essa árdua missão (Êxodo 4).
A primeira páscoa foi instituída no Egito, para marcar o princípio dos meses – como o início do ano religioso, como marco da redenção do povo hebreu e da sua liberdade (Êxodo 12:2). A ordem divina escolhe o mês de Nisã, início da primavera no hemisfério norte, para ser o primeiro mês do ano israelita.
A celebração da Páscoa
A celebração da Páscoa seria uma festa familiar, o cardápio principal seria um cordeiro de um ano sem defeito para cada família. O cordeiro seria separado no dia 10 de Nisã e guardado por quatro dias. Do décimo ao décimo quarto dia o cordeiro ficaria em observação para que não apresentasse nenhum defeito, a fim de estar apto para o sacrifício. No dia da Páscoa 14 de Nisã o cordeiro seria sacrificado à tarde (Êxodo 12:3-6). Segundo Flávio Josefo, esse sacrifício era oferecido entre as 15 e 17 horas.
Acrescenta-se ao cardápio principal a matzá – pães ázimos (pão sem fermento), e o marór – ervas amargosas. A matzá – refere-se ao pão da aflição, da privação de ser escravo, e que também se tornou o símbolo da liberdade. Enquanto o marór – refere-se a amargura de ser escravo.
Os dois juntos para o judeu, tem um significado de dualismo da vida, se por um lado há liberdade, não se deve esquecer jamais a amargura da escravidão, e, nos tempos de opressão, a chama da esperança de liberdade deve-se manter acesa.
Ou como encontramos no comentário dos editores da Torá – a Lei de Moisés: “A união desses dois elementos ensina que apenas quem experimentou o doce sabor da liberdade é capaz de compreender a amargura da opressão, e vice-versa. É a convivência milenar com esse dualismo que fez o povo judeu suportar tantas e tão nefastas provocações no decorrer de sua história, até alcançar, o restabelecimento de seu próprio estado nacional em nossos dias, que, baseado nos ensinamentos da Torá, representa o prenúncio da concretização das profecias messiânicas e da redenção global da humanidade” (Torá, 2001, p. 185).
Além disso, há a restrição de não comer “nada cru, nem cozido em água, senão assado no fogo”, e isso não é tudo, deveria se comer o cordeiro com “a sua cabeça com os seus pés e com a sua fressura”, o cordeiro inteiro simboliza a unidade completa de toda a família de Israel; sem sobras, e o que sobrar seria queimado pela manhã (Êxodo 12:8-10).
E o jeito de se comer a Páscoa na saída do Egito é ordenado aos filhos de Israel: “Assim pois o comereis: Os vossos lombos cingidos, os vossos sapatos nos pés, e o vosso cajado na mão; e o comereis apressadamente; esta é a páscoa do Senhor” (Êxodo 12:11), lombos cingidos, sapatos nos pés e cajado na mão, por quê? Porque acontecerá a libertação da escravidão, a saída do Egito – o Êxodo; “esta é a páscoa do Senhor, páscoa (heb. Pessach) significa: passagem; passar por cima, quando o Senhor passaria pelo Egito para derramar a décima e última praga, a morte dos primogênitos (Êx.12:12,13).
O sangue do cordeiro
Deus ordenou que o sangue derramado do cordeiro, fosse passado nas portas das casas dos hebreus: “E tomarão do sangue, e pô-lo-ão em ambas as ombreiras, e na verga da porta, nas casas em que o comerem” (Êxodo 12:7). A fé do povo foi manifestada em função da obediência ao mandamento divino. O sangue passado na verga e nos umbrais, foi o sinal que Deus usou para poupar a vida dos filhos primogênitos no momento que o anjo da morte passou, ferindo a terra do Egito: “E aquele sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes; vendo eu sangue, passarei por cima de vós, e não haverá entre vós praga de mortandade, quando eu ferir a terra do Egito” (Êxodo 12:13).
Os israelitas usaram o hissopo para passar o sangue na verga e nas ombreiras das portas, e ficaram dentro de suas casas protegidos pelo sangue do cordeiro, conforme lemos em Êxodo 12:22-23: “o SENHOR passará para ferir os egípcios, porém quando vir o sangue na veja da porta, e em ambas as ombreiras, o SENHOR passará aquela porta e não deixará o destruidor entrar em vossas casas, para vos ferir”.
Considere isso, cada família israelita sacrificar um cordeiro no Egito poderia se visto como uma grande afronta às crenças dos egípcios, pois “O carneiro era um animal sagrado entre os egípcios. Aqueles dentre os israelitas que não tivessem coragem de afrontar os egípcios, matando um carneiro e aspergindo o sangue nas portas, no lado externo de suas casas, não gozariam de isenção da morte do primogênito. Assim, desde os tempos bíblicos, o israelita-hebreu-judeu é educado a ter a sinceridade e a coragem de proclamar publicamente sua crença e fé no Deus único” (Torá, 2001, p. 186), felizmente esse ato de fé e coragem terminou bem para os israelitas.
As 10 pragas sobre os deuses do Egito
Os juízos de Deus enviados ao Egito foi uma clara demonstração de superioridade sobre os falsos deuses do Egito em contraste ao único, vivo, verdadeiro e todo poderoso Deus de Israel, conforme lemos em Êxodo 12:12: “E eu passarei pela terra do Egito esta noite, e ferirei todo o primogênito na terra do Egito, desde os homens até aos animais; e em todos os deuses do Egito farei juízos. Eu sou o Senhor”, as pragas feriram mortalmente as divindades egípcias de acordo com Carlos Osvaldo:
- A praga das águas transformadas em sangue revelou a autoridade de Yahweh sobre o Nilo, o rio sustentava a vida do Egito (7:14-24).
- A praga de rãs revelou a superioridade de Yahweh sobre a deusa Heqt e produziu o primeiro ciclo de permissão-negação por parte de Faraó (8:1-14).
- A praga dos piolhos revelou a superioridade de Yahweh sobre o deus Set, o deus do deserto [poeira?] e levou os magos a admitir a intervenção divina (8:16-19).
- A praga das moscas revelou a superioridade de Yahweh sobre o deus Uatchit, estabeleceu a distinção entre Israel – a nação a ser libertada – e o Egito –, a nação a ser julgada, e fez Faraó repetir sua falsa promessa de permissão (8:32).
- A praga da peste nos rebanhos egípcios demonstrou a superioridade de Yahweh sobre Ápis, o deus-touro, e Hathor, a deusa-vaca, ao preservar o gado dos israelitas (9:1-7).
- A praga das úlceras nas pessoas e no gado demonstrou a superioridade de Yahweh sobre Ísis, a deusa da cura, sobre Sekhmet, deusa dos remédios, e sobre Sunu (deus da peste), incapacitando os magos que se opunham a Moisés e Arão (9:8-12).
- A praga da saraiva revelou a superioridade de Yahweh sobre Nut [deus do céu], Osíris [deus das colheitas e da fertilidade] e Set [deus das tempestades], inspirando temor de Deus em alguns oficiais egípcios, em contraste com a renovada dureza de Faraó (9:13-35).
- A praga dos gafanhotos revelou a superioridade de Yahweh sobre Nut e Osíris e evidenciou o profundo descontentamento na corte do Egito com a política obstinada de Faraó, que o levou a violar sua promessa mais uma vez (10:1-20).
- A praga das trevas revelou a superioridade de Yahweh sobre Rá e Hórus, divindades do sol, e sobre Nut, deus do céu, produzindo uma confrontação final entre Moisés e Faraó (10:21-29).
- A anunciada praga da morte dos primogênitos revelaria a superioridade, de Yahweh, sobre Min, deus da reprodução, sobre Ísis, a deusa da cura, e sobre o herdeiro de Faraó, considerado divino pelos egípcios, quebrando por fim a obstinada resistência do monarca quanto à libertação de Israel (11:1-10) (PINTO, 2006, p. 75-76).
Jetro, o sogro de Moisés reconheceu: “(…) O Senhor é maior que todos os deuses (…)” (Êxodo 18:10-11).
A Páscoa como memorial eterno
A celebração da páscoa passou a ter um caráter eterno: “E este dia vos será por memória, e celebrá-lo-eis por festa ao Senhor; nas vossas gerações o celebrareis por estatuto perpétuo” (Êxodo 12:14), podemos entender a razão do memorial nas palavras do Rabino Lord Jonathan Sacks: “o antigo Egito e a antiga Israel eram dois povos que fizeram a mais decisiva das perguntas: como, num curto período de tempo, é possível criar algo que perdure para sempre? Como é possível conquistar a imortalidade? Os egípcios deram uma resposta: construir grandes monumentos de pedra – templos, pirâmides – que resistirão aos ventos e areias do tempo. E assim fizeram. O que eles construíram continua em pé. Mas apenas os edifícios, e não a civilização que um dia lhes deu vida. Os israelitas deram uma resposta diferente. Vocês não precisam criar monumentos. Tudo o que precisam fazer é contar a história de geração após geração. Vocês precisam gravar seus valores nos corações dos seus filhos e eles nos dos filhos deles, de modo que vocês vivam dentro deles, e assim por diante, até o fim dos tempos”, a história provou que os israelitas estavam certos. Este ano vamos ouvir novamente: “Hag Pessach Sameach – Feliz festa de Páscoa”.
A Páscoa do Egito e o Messias
Agora, aqui está o próximo passo – entender como a festa da Páscoa e seus agentes se aplica ao Messias de Israel e a sua obra salvadora.
Em primeiro lugar o Senhor Jesus é apresentado por João o Batista como: “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1:29b), ele é o cordeiro prometido que derramaria o seu precioso sangue para salvar a humanidade caída, aqui está o porquê: “e sem derramamento de sangue não há remissão” (Hb.9:22b), essa é uma referência explicita a Levítico que fala da expiação do pecado pelo derramamento de sangue no altar.
O cordeiro era escolhido, separado para ficar em observação e, se apresentasse as condições necessárias, era sacrificado e tinha o seu sangue passado sobre a verga e os umbrais das portas dos israelitas. Tendo isso em vista, vejamos a comparação com a vida e a obra do Senhor Jesus:
– O Senhor Jesus após três anos e meio de ministério público havia sido examinado pelo povo de Israel: “Quem dentre vós me convence de pecado? E se vos digo a verdade, por que não me credes?” (João 8:46), e foi achado sem culpa, perfeito;
– Depois de ser preso foi interrogado pelo Sumo Sacerdote e pelo Sinédrio: “Ora, os principais sacerdotes, e os anciãos, e todo o conselho, buscavam falso testemunho contra Jesus, para poderem dar-lhe a morte; 60. E não o achavam; apesar de se apresentarem muitas testemunhas falsas, não o achavam. Mas, por fim chegaram duas testemunhas falsas” (Mt.26:59-60), tirando as duas falsas testemunhas foi achado novamente sem culpa, apto como um cordeiro imaculado;
– Também foi examinado pelas autoridades políticas de Israel Pilatos o presidente romano da Judéia e o rei Herodes: “E, convocando Pilatos os principais sacerdotes, e os magistrados, e o povo, 14. Disse-lhes: Haveis-me apresentado este homem como pervertedor do povo; e eis que, examinando-o na vossa presença, nenhuma culpa, das de que o acusais, acho neste homem. 15. Nem mesmo Herodes, porque a ele vos remeti, e eis que não tem feito coisa alguma digna de morte” (Lucas 23:13-15), nem a cúpula política de Israel encontrou culpa em Jesus.
Depois de um exame minucioso como do cordeiro pascal, o Senhor Jesus é escolhido profeticamente pelo sumo sacerdote Caifás para morrer em lugar do povo: “Nem considerais que nos convém que um homem morra pelo povo, e que não pereça toda a nação” (João 11:50).
O pão da Páscoa – Matzá
Como se não bastasse temos a figura da matzá o símbolo de aflição, especialmente quando quebrada, mas também de pureza por estar isenta de fermento – símbolo de pecado na Bíblia (1Co.5:8). Para nos salvar, Deus teve que se tornar homem, fazer parte da raça (1 Tm.2:5) mas sem pecado, e sofrer em carne! Ele se tornou homem (matzá quebrada), porém nunca deixou de ser Deus (matzá devolvida ao Ehad). Como homem ele sofreu por nós (Isaías 53:1-12; Mateus 26:26-29).
Jesus entregou seu espírito na hora nona (16h.), conforme Lucas 23:44-46: “E era já quase a hora sexta, e houve trevas em toda a terra até à hora nona, escurecendo-se o sol; 45. E rasgou-se ao meio o véu do templo. 46. E, clamando Jesus com grande voz, disse: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito. E, havendo dito isto, expirou.” (conf. Mt.27:46; Mc.15:33-37), confirmando o registro do historiador judeu Flávio Josefo.
Diante de todos esses fatos bíblicos o apóstolo Paulo pode afirmar: “Porque Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós” (1 Coríntios 5:7b), assim como a morte do cordeiro pascal marcou a liberdade da escravidão do povo de Israel, a morte do Messias naquela semana de páscoa marcou a liberdade da escravidão do pecado do homem.
Fonte: Gospel Prime